Masculinidades em construção, corpos em (re)construção: desejos, contradições e ambiguidades de homens trans no processo transexualizador

Abstract

Resumo O artigo traz os resultados de uma pesquisa sobre as estratégias, expectativas e desejos de 28 homens transexuais na construção das suas masculinidades e reconstrução de seus corpos por meio da hormonização cruzada. A pesquisa qualitativa foi realizada em um ambulatório do processo transexualizador de um município da região metropolitana do Rio de Janeiro. Para a construção dos dados, foram utilizadas a entrevista semiestruturada e a observação participante, empreendidas entre os meses de novembro de 2019 e janeiro de 2020. A análise de conteúdo orientou a análise das falas, das quais emergiram as categorias que foram discutidas à luz dos conceitos de gênero, transexualidade e masculinidades, além de referências de estudos sobre raça/cor em suas articulações com a saúde. Os dados revelaram desejos, contradições e ambiguidades no que diz respeito à construção da masculinidade e à (re)construção de corpos mais adequados a ela; evidenciaram o desejo pelo padrão corporal de masculinidade que seria conquistado por meio da hormonização e de cirurgias, e a cor negra surgiu como uma importante marca de desigualdade. Concluímos que, mesmo refutando muitos traços do modelo de masculinidade, esses homens desejam adentrar esse mundo e confundir-se na multidão como homens, vivenciando a masculinidade mais plena.

Caracterização do perfil clínico de pessoas trans masculinas que serão submetidos a mamoplastia masculinizadora

“…O atendimento nos ambulatórios TT pretende promover um cuidado equânime e um acolhimento especializado. Além disso, cria ambientes seguros e afirmativos, onde as pessoas transgêneros podem trocar informações e vivências e se inserir nos serviços de saúde sem ser invisibilizados ou discriminados pela sua expressão de gênero, iniciando assim cuidado e acompanhamento para a hormonioterapia e o acesso a cirurgias masculinizadoras (Ribeiro et al, 2022;Turban et al, 2022).…”

“…Comumente, busca-se com o uso dos hormônios a redução das mamas, o aparecimento e aumento de pelos, diminuição de curvas predominantemente femininas pelo corpo, a suspensão do ciclo menstrual e a mudança da voz para tons mais masculinos. Buscam um corpo tratado como adequado pela sociedade e que impositivamente eles aprendem a valorizar (Ribeiro et al, 2022).…”

“…Outro fator essencial para promoção da saúde física e mental é o suporte familiar, que se torna extremamente necessário diante de todas as mudanças que ocorrem no processo transexualizador, com ênfase na assistência necessária no pós-operatório de uma cirurgia como a mamoplastia masculinizadora (Ribeiro et al, 2022). A desvinculação familiar geralmente se dá pela não aceitação e discriminação de gênero que geram conflitos frequentes e causam grande sofrimento (Santos & Melo, 2022).…”

“…Diante disso, as mudanças corporais se iniciam em busca da masculinidade hegemônica como um efeito controlador capaz de impor características como cabelos curtos, barba no rosto, corpo forte, sem seios, pelos pelo corpo, roupas e trejeitos masculinos. Dessa forma, a hormonização e as cirurgias são meios utilizados para conquistar a passabilidade que assegura o acesso a direitos individuais e essenciais na construção da singularidade (Lima & Cruz, 2016;Ribeiro, et al, 2022).…”