Movimentos sociais na América Latina: elementos para uma abordagem comparada

Abstract

A análise das mobilizações a partir da categoria "novos movimentos sociais", construída na Europa, continua sendo dominante na abordagem dos movimentos latino-americanos. Este artigo lembra, na sua primeira parte, as especificidades dos movimentos "de base" nascidos durante os anos 1970 na América Latina. Em seguida, mostra as diferenças entre os debates e as abordagens das mobilizações, de um continente para o outro. Quando, sobre a América Latina, se insistiu muito sobre os valores, as mudanças culturais e as identidades, nos Estados Unidos o enfoque foi para a análise das organizações, das estratégias e das práticas. A terceira parte do artigo mostra as consequências dessa divergência científica para a observação dos processos de institucionalização dos movimentos sociais, assim como para a análise da contestação na América Latina nos anos 2000.

Parentelas, grupos dirigentes e alianças políticas

“…Tais formulações têm como base a inserção e circulação de estudantes e pesquisadores entre grupos e redes de pesquisa vinculadas a universidades e instituições dos EUA e da Europa, especialmente da França. Semelhante ao que tem acontecido em outras áreas de investigação (GOIRAND, 2009(GOIRAND, , 2010OLIVEIRA, 2013), isso contribui para que conceitos consagrados ou problematizados pela produção acadêmica internacional sejam aceitos sem maiores questionamentos a respeito de sua aplicabilidade para a situação brasileira.…”

“Fora do Eixo: Estado ou mercado?” Modos de mediação entre produção cultural, política e mercado no Brasil

“…A literatura dos movimentos sociais no Brasil tem abordado o tema de forma mais tangencial a partir dos chamados "novos movimentos sociais". A novidade desses movimentos localiza-se em duas características: na associação entre mudança política e social e numa forma de organização mais fluida, fragmentada e instável (Goirand, 2009;Alonso, 2009). As caraterísticas desses movimentos, descritas por diversos autores, referem-se principalmente à participação dos sujeitos, que não está claramente definida pelo pertencimento a uma classe social, ou por uma estrutura ideológica unificada, mas sim, pela pluralidade de valores e representações, pela priorização na definição de metas pragmáticas, e também à descoberta de novos canais de participação política, identificados pelos próprios sujeitos integrantes como organizações descentralizadas e fragmentadas (Goirand, 2009).…”

“…A novidade desses movimentos localiza-se em duas características: na associação entre mudança política e social e numa forma de organização mais fluida, fragmentada e instável (Goirand, 2009;Alonso, 2009). As caraterísticas desses movimentos, descritas por diversos autores, referem-se principalmente à participação dos sujeitos, que não está claramente definida pelo pertencimento a uma classe social, ou por uma estrutura ideológica unificada, mas sim, pela pluralidade de valores e representações, pela priorização na definição de metas pragmáticas, e também à descoberta de novos canais de participação política, identificados pelos próprios sujeitos integrantes como organizações descentralizadas e fragmentadas (Goirand, 2009). Nesse contexto, surgiram movimentos vinculados à produção cultural, que mais do que fazer uma reinvindicação específica sobre a produção em si, cumprem um importante papel na construção da identidade, como é, por exemplo, o caso do Olodum na cidade de Salvador, na Bahia (Yúdice, 2000(Yúdice, , 2002.…”

“…Contudo, dentro desse esquema de vinculação entre o Estado e a sociedade civil, há ainda outros enfoques, que retomam aqueles sujeitos vinculados à militância em movimentos sociais e que passaram a fazer parte dos quadros políticos, especialmente do PT, e incorporaram-se ao próprio governo 12 (Goirand, 2009;Ruskowski e Silva, 2011). Alguns autores têm interpretado esse fenômeno como uma forma de incorporar os movimentos sociais ao Estado, ou seja, àquilo de que tentavam se separar (Goldman, 2007).…”

Abaixo a ditadura: movimentos sociais no Brasil em 1968

“…Nos anos de 1960, irromperam também movimentos de ordem ética e identitária, como os movimentos pelos diretos civis norteamericanos e os movimentos feministas, cujos ideais se propagavam pelo mundo. Tais manifestações traziam em comum a ausência de um movimento de classe claramente definido, prioridade por demandas ligadas à justiça social e dignidade, utilização de novos canais de participação política e mecanismos de mobilização, diferenciação em suas estruturas organizacionais, variação nos mecanismos de protesto e no foco das manifestações (GOIRAND, 2009). A continuidade das mobilizações e o local onde estas se originaram -grandes centros urbanos de países desenvolvidos -iriam colocar em xeque as chamadas teorias da desmobilização, que obtiveram grande reconhecimento, principalmente nos EUA, entre os anos de 1930de e 1950de (ALONSO, 2009.…”