Resumo: Neste artigo objetivamos demonstrar como Eduardo Galeano configura sua narrativa, adequando-a as exigências próprias da historiografia. Procedemos a uma análise formal e de conteúdo, investigando a maneira como o escritor uruguaio, em seu texto "La reconquista de Brasil", da obra Memoria del fuego (2010), consegue atender a imperativos do fazer historiográfico, como a datação dos fatos, o registro documental, a crítica das fontes, os agentes históricos e a objetividade da linguagem. Os resultados da análise revelaram que Galeano compõe outra perspectiva narratológica para abordar o Golpe Militar de 1964, no Brasil. Nesse sentido, concluímos que a forma como Galeano compõe o seu texto pode ser vista como uma narrativa historiográfica que não se afasta da Teoria da Literatura, mas agrega sua metodologia.
Abstract:In this article we aim to demonstrate how Eduardo Galeano configures his narrative, adapting it to the demands of historiography. We proceed to a formal and content analysis, investigating the way the Uruguayan writer, in his text "La reconquista de Brasil", from the work Memoria del fuego (2010), can meet the imperatives of historiographic making, such as the dating of facts, the documentary register, the critique of the sources, the historical agents and the objectivity of the language. The results of the analysis revealed that Galeano composes another narrative perspective to approach the 1964 Military Coup in Brazil. In this sense, we conclude that the way Galeano composes his text can be seen as a historiographical narrative that does not deviate from the theory of literature, but adds its methodology. Keywords: Theory of History; Theory of Literature; Narrative; Eduardo Galeano Heloisa H. R. Miranda et al. A Configuração da narrativa historiográfica.... Revista da Anpoll v. 1, nº 50, p. 58-69, Florianópolis, Set./Dez 2019 59
A narrativa como forma de humanização do tempo físicoA narrativa é o gênero ao qual o homem confia o conteúdo de sua existência, em formas orais ou escritas, estruturando-se em fábulas, contos, novelas, romances, epopeias, dramas, tragédias etc. "Não há em parte alguma povo algum sem narrativas; todas as classes; todos os grupos humanos têm suas narrativas", diz Barthes et al (2013, p. 19). Para Maurice Blanchot (2005), a narrativa realiza a ação simultânea de falar sobre o acontecimento, ao mesmo tempo em que se produz, autogestação possível porque detém o ponto e o plano no qual a realidade narrativa se manifesta. Ressalta-se que, embora o caráter axiomático da narrativa seja a travessia do conteúdo, expresso em estruturas diversas, não há como desconsiderar a experiência temporal e espacial que nela reside, uma vez que a narrativa é tempo e espaço conjugados e, por isso, é o lugar onde tais dimensões se realizam.Então, além de carrear as informações sobre o mundo e seus habitantes, a narrativa é o meio pelo qual o tempo físico se humaniza, de acordo com Ricoeur: "o tempo torna-se tempo humano, na medida em que ele se articula de modo narrativo; a narrativa atinge sua s...