Família, modernização capitalista e democracia: retomando alguns marcos do antigo debate sobre as transformações da família no Brasil

Abstract

ResumoO artigo analisa as transformações da família no Brasil ocorrido sob a influência da modernização capitalista e dos movimentos sociais libertários em defesa da democracia, da liberdade e igualdade, reconhecimento das diferenças e dos direitos humanos e individuais. De forma não exaustiva procura recuperar alguns dos principais marcos dessas mudanças, com destaque para o período pós-1964, quando se deu a aceleração do processo de modernização e a revolução de valores que levou à crise da família nos anos 1970 e à sua passagem, nas décadas seguintes, do tradicional modelo hierárquico e autoritário para outras formas de organização familiar mais democráticas e igualitárias. Instituição historicamente determinada, a família acompanha as mudanças da sociedade incorporando novos valores, funções e formas de organização, de acordo com as ideologias dominantes e necessidades sociais, culturais, econômicas e políticas de cada época. PalavrasCom base nessa compreensão histórica este artigo analisa as transformações da família brasileira, destacando duas principais influências: a modernização capitalista, em especial o projeto modernizador implantando pelo governo pós-64 que, apesar de conservador e repressor, promoveu grandes transformações sociais, econômicas e culturais; e a expansão dos movimentos sociais libertários que ganharam corpo nos anos 1970, embalados pelos

O cuidado parental igualitário: implicações para a construção de um modelo de interação triádica pai-mãe-bebê

“…Nas sociedades ocidentais durante muito tempo o parâmetro estrutural de família tem sido aquele que é composto em seu núcleo pelo casal heterossexual, legitimado pelo casamento, e seus filhos(as). Na atualidade, este tipo de formato constitutivo transita entre outros, como as famílias: monoparentais, homoparentais, reconstituídas, coparentais (divisão de atribuições parentais em relação à(s) crianças, compartilhadas entre casais de gays e lésbicas), de casais sem filho(a) (Araújo, 2011;Corrêa, 2012;Grossi, 2003) e, ainda, artificiais (família constituída por pai(s) e mãe(s) biológicos, doadores de material genético, e pelos pai e mãe sociais, responsáveis pelos cuidados e educação da criança) (Gradvohl, Osis & Makuch, 2014).…”

“…Isso Quanto à organização disposicional, a família dita tradicional, fundamentada em seus alicerces pela ideologia patriarcal, dividia as relações de forma hierárquica (verticalização de poderes) e situava o homem numa posição de domínio e autoridade na regência familiar. Nessa disposição, a mulher encarregava-se do cuidado com as crianças e da manutenção do ambiente doméstico, subjugando-se à autoridade masculina e aos ditames maritais (Araújo, 2011). As famílias contemporâneas, no entanto, têm apresentado uma organização democrática (horizontalização de poderes) e uma circulação de lideranças em permanente negociação.…”

“…Trata-se na verdade de uma ausência de hierarquias e de relações de dominação. Homens e mulheres compartilham dos afazeres cotidianos e exercem suas funções em espaços intersubjetivos e intercambiantes, com a garantia do respeito às suas autonomias e necessidades (Araújo, 2011;Viala, 2011). Esta nova tendência de cuidado parental tem sido observada em algumas sociedades ocidentais, principalmente, naquelas que promovem políticas e estratégias sociais para diminuir as desigualdades de gênero e garantir a cidadania aos indivíduos.…”

“…Esta disparidade, gerada pela formação de estados democráticos cujo sistema econômico é o capitalista, reflete-se numa maior disseminação do cuidado parental igualitário nas camadas populacionais mais urbanizadas, com maior poder aquisitivo e melhor acesso à formação educacional. Em contraposição, nos outros seguimentos populacionais observa-se ainda uma prevalência da divisão hierárquica de dominância masculina, mesmo quando a mulher também ajuda no provimento financeiro (Araújo, 2011).…”

“…O feminismo também teve um papel crucial para a fomentação e mobilização desse contexto igualitário, já que tornou-se uma via possível de militância a nível macrossocial em prol dos direitos pela igualdade e dignidade das mulheres. O discurso feminista tinha e continua tendo em sua essência um caráter desconstrutivo, no sentido de rever, reinterpretar, desvelar preconceitos implícitos e subverter as normatividades que subjugam a mulher a um lugar social desvalorizado (Araújo, 2011;Viala, 2011). Alguns autores entendem que a defesa pelos homens dos ideais igualitários está diretamente atrelada à segurança em relação ao estatuto introjetado de masculinidade no indivíduo, assim, enquanto alguns homens se sentem mais ameaçados em sua masculinidade por uma demarcação mais flexível de estereótipos e tendem a reassegurar a masculinidade a partir de discursos machistas, outros se sentem mais seguros para endossar o discurso igualitário (Kosakowska-Berezecka et al, 2016).…”