IntroduçãoEm 2014 e 2015, o artista brasileiro Ernesto Neto criou instalações inspiradas em sua experiência entre os Huni Kuin, também conhecidos como Kaxinawa.1 Este texto é uma tentativa de refletir sobre questões suscitadas por essa aproximação entre um artista contemporâneo não indígena, fascinado pelos conhecimentos e artes da floresta, e alguns Huni Kuin dispostos a adentrar o universo das metrópoles e dos museus.Tirando partido dos ângulos de visão de duas antropólogas com trajetórias distintas, 2 e considerando que não encontramos nenhuma outra publicação acadêmica sobre a parceria entre Neto e os Huni Kuin, buscamos uma abordagem caleidoscópica que ajude a pensar sobre esta complexa interseção entre arte, espiritualidade, internacionalização e ressignificação de práticas e objetos tradicionais em novos contextos. Nosso principal objetivo foi construir uma problemática, articulando campos de conhecimento e autores de forma inovadora. Não pretendemos esgotar nem a etnografia, nem os tópicos mencionados, mas, antes, fazer com que se iluminem reciprocamente e ajudem a entender os intercâmbios culturais e as invenções indentitárias em curso.Começamos introduzindo brevemente os Huni Kuin. Em seguida, traçamos um panorama da expansão do uso da ayahuasca nas cidades brasileiras e analisamos a progressiva presença indígena em museus de arte. Após esse pano de fundo contextual, apresentamos exposições em que Ernesto Neto e alguns Huni Kuin colaboraram de diversas maneiras. Uma exposição no Brasil e outra na Áustria merecem maior atenção, porque uma autora esteve diversas vezes na mostra de São Paulo, enquanto outra passou uma semana em contato com organizadores e artistas em Viena. O texto levanta, então, problematizações como o status legal da ayahuasca, a questão da propriedade intelectual coletiva, as negociações em torno da alteridade, apropriação cultural e ressignificação de objetos e práticas.