ResumoEste artigo teve como objetivo investigar o impacto da semântica negativa do lixo na organização do trabalho, o reconhecimento social e a identidade profissional dos classificadores de uma usina de separação de recicláveis na cidade do Rio de Janeiro. Os dados foram obtidos mediante observação participante e entrevistas com 32 pessoas, entre cooperados e coordenadores de projetos. Por semântica negativa do lixo entendemos os significados atribuídos ao lixo que levariam a uma associação de seus trabalhadores (catadores, lixeiros) com o estigma (Eigenheer, 2003;Magera, 2003;Portilho, 1997). Os classificadores da usina de separação não interagem com a sociedade enquanto trabalham, o que amenizaria o impacto dessa semântica negativa do lixo. Todavia, prevalecem uma baixa autoestima e uma baixa valorização da profissão em função dos rendimentos e da assimetria de informação, impedindo a formação de laços (filiação) com a organização e, consequentemente, a identificação dos trabalhadores com a usina. Embora esta tenha sido criada com o objetivo de promover melhores ganhos, constatou-se que a organização do trabalho, o reconhecimento social e a identidade profissional permaneceram inalterados, exatamente pelo não alcance desses aspectos. Assim, os efeitos da semântica negativa do lixo, como a dificuldade de formação de laços de solidariedade e de confiança mútua (Carmo, 2009a;2009b), seriam fruto da incompreensão sobre a lógica de negociação do produto do trabalho dos classificadores de lixo.