Nos dias que correm, duas perspectivas de relações entre ciência e política têm se destacado. Uma delas afirma a neutralidade política e ideológica da ciência e, assim, sua isenção de compromissos com as decisões próprias às transformações sociais desse âmbito; indica a importância da ciência para o avanço do progresso, da tecnologia, e, assim, para a melhor vida de todos, o que é certamente um propósito apreciável. A outra tendência apresenta como fim precípuo da ciência a atuação política, de modo que a ciência deve contribuir já em seus objetivos e métodos com a transformação social. A primeira delas dá ênfase às forças produtivas; a outra, às relações de produção; e não é exagero dizer que a opção "cientificista" despreza, pelo menos de forma imediata, a influência que as relações de produção -isto é relações entre classes sociais -possam ter sobre ela, e a outra, quase que despreza o valor do avanço tecnológico para romper e superar essas relações. Se para Marx (1984), as forças produtivas deveriam arrebentar os grilhões das relações de produção, para Adorno (2004), a não efetivação da previsão marxiana está relacionada ao fato de que essas forças foram aprisionadas pelas relações de produção; dessa forma, quanto mais a ciência e a tecnologia avançam dando condições de vida mais confortáveis à maioria da população, mais se fortalecem as relações de produção que sustentam essas condições. De fato, não é desprezível o avanço social ocorrido devido ao avanço das forças produtivas, e esse avanço certamente é fundamental para que a esfera da necessidade não impere sobre a esfera da liberdade para sempre; no entanto, as relações sociais continuam injustas, e como exemplos basta lembrar a atual situação dos refugiados na Europa, que veem as fronteiras de alguns países fechadas para que tentem sobreviver ou o desastre ambiental ocorrido no interior de Minas Gerais, com a lama proveniente da não sustentação de uma barragem de resíduos de minerais; em ambos exemplos, ainda que de natureza muito diversa, a exploração dos que socialmente podem mais sobre os que não podem faz visível a injustiça social.De outro lado, a tendência científica que se auto--anula para defender imediatamente interesses políticos dos injustiçados perde o auxílio de uma grande aliada -a ciência -quando essa é absorvida por esses fins políticos. As pesquisas que mostram, por meio de métodos científi-cos -os mais diversos -a falsidade de diversos estereóti-pos sociais, por exemplo, são importantes para o combate à ideologia. Quando uma opinião é verificada por meio de uma enquete, e suas frequências e porcentagens são expostas, há um conhecimento importante que deveria ser interpretado por meio de uma sólida teoria; desprezar esses dados, porque são frutos de medidas quantitativas, é perder graus de liberdade que o conhecimento proporciona. Mais do que isso, se o progresso do conhecimento diz respeito à diferenciação de diversas esferas sociais, a redução de uma à outra implica sua regressão. Como se verá a seguir, se a Ética e a Epistemologia nã...