A fi cção não tem por horizonte dizer certezas mas ultrapassar o limite do real. Paul RicoeurDe maneira instigante, Jöel Candau identifi ca razões práticas e culturais da memória, precisando suas operações funcionais fundamentais: ordenar o tempo, transmitir um saber e encontrar um lugar em uma linhagem, funções intimamente ligadas entre si (2002, p. 56) e que na fi cção poética da alta modernidade, acrescentaria, carregam insólitas visões de outras realidades na superação dos códigos realista-naturalistas convencionais.Com essa perspectiva, adentro-me na poesia de Cecília Meireles (Brasil, 1901(Brasil, -1964 e Dulce María Loynaz (Cuba, 1902(Cuba, -1997, em uma leitura atenta a suas contribuições estéticas como autoras relevantes das literaturas brasileira e cubana, hispânicas e lusófonas, artífi ces da palavra poética nas respectivas culturas e línguas. Também fi guras que compartilham, com suas poéticas singulares, uma estética memorialista e refl exiva; simbolistas extemporâneas, avant la lettre, na verdade inclassifi cáveis ao fundar sua pró-pria genealogia, além de qualquer cânone literário de época.Interesso-me, em particular, por Últimos días de una casa (1958) e Solombra (1963), poemas-livros contemporâneos da problemática do ser na temporalidade e dos processos de constituição/destruição da identidade que acontecem, precisamente, no tempo humano da memória. Nesses poemas, Cecília Meireles e Dulce María Loynaz, ao rememorar, pensam o mundo e a poesia, além de pensar a si mesmas, fazendo fi cção memorável da experiência vital e criativa.