Colecionando arte e antropologia: controvérsias nos museus de Barcelona

Abstract

Resumo O trabalho aqui apresentado pretende percorrer acontecimentos que circundaram museólogos, antropólogos e historiadores da arte ao menos desde 2011 em Barcelona. Trata de acompanhar os desdobramentos da reclassificação da Coleção Folch de “arte exótica” e as implicações da exibição de seus objetos em dois museus da cidade. Os relatos sobre fatos, notícias, documentos e decisões aqui expostos foram coletados prioritariamente a partir de entrevistas com os profissionais envolvidos. Estes narraram a seu modo a sequencia de ocorrências que desencadeou disputas em torno dos conceitos de “arte” e “antropologia” quando atribuídos às coleções. Propõe-se, portanto, seguir esses acontecimentos para a partir deles debater as transformações recentes no campo dos museus etnográficos.

Espanha e seus museus pela construção do conhecimento antropológico

“…Na segunda etapa, já como bolsista de doutorado sanduíche pela Capes, estendi as atividades de pesquisa a Barcelona e dois de seus museus. Dessa vez vinculada à Universitat de Barcelona 6 , acompanhei a reabertura do Museo Etnológico, fechado para reformulação havia quatro anos, e os primeiros meses de atividade do recém-inaugurado Museo de las Culturas del Mundo, com toda a controvérsia que envolveu antropólogos e historiadores da arte sobre sua concepção (Montechiare, 2019).…”

“…Na outra margem, as coleções de "etnologia" contemporaneamente apresentadas no principal expoente desse tipo de museu na Espanha concentram-se na acumulação de objetos dedicados a transmitir a transição à sociedade contemporânea. O MEB, inaugurado em 1949 na Renata Montechiare montanha de Montjüic, foi reaberto em 2015 depois de anos fechado para obras, imerso numa controvérsia que envolveu a criação de outro museu, este "de culturas": o Museo de las Culturas del Mundo de Barcelona (Montechiare, 2019). O Museu Etnológico detém coleções que tratam da cultura catalã e de seus modos de vida, acionando memórias.…”

“…No entanto tomam como pressuposto a noção ampla de que os termos articulam as diferentes manifestações e formas de vida tradicionais -ainda que uma etnografia não tenha sido efetivamente produzida na ocasião da coleta dos objetos ou depois. No caso do MEB, mesmo que as coleções adquiridas em viagens sejam apresentadas como frutos do "trabalho de campo", não são acionadas como "etnográficas" pelo conjunto de profissionais do museu, como se a característica demandasse dedicação de tempo e pesquisa incompatíveis com o que foi realizado durante as expedições (Montechiare, 2017).…”

Coleções, colecionadores e práticas de representação

“…O presente texto adentra o debate sobre a exibição de corpos e partes de corpos humanos em museus nos dias de hoje. Prática relativamente comum em museus europeus de antropologia desde o século XIX (Dias, 2004), e também verificada neste período em outros espaços de sociabilidade, como necrotérios e cemitérios (Schwartz, 2001), sua pertinência atual vem sendo questionada contemporaneamente (Jenkins, 2011;Kim, 2012;Lohman, Goodnow, 2006;Montechiare, 2017).…”

“…A instituição havia organizado suas coleções, a reserva técnica e as exposições a partir da compreensão do novo cenário pós-redemocratização da Espanha, contando com uma equipe que ingressou no Museu a partir do final dos anos 1970 e ascendeu à direção. Neste ambiente, uma das propostas museográficas mais significativas produzidas foi a constituição da Sala de Antropología Física ou "el gabinete de curiosidades del Dr. Velasco" (ver Montechiare, 2017). Para essa montagem, foram recuperados acervos de restos mortais humanos e animais das coleções originárias do Museu que já não eram exibidos desde as primeiras décadas do século XX, quando a museografia produzida rompeu com as perspectivas evolucionistas, por não coadunarem com a ideologia do regime implantado a partir de 1939, com o fim da Guerra Civil (Barañano, Cátedra, 2005 Romero de Tejada, 1977).…”