Adotando como referência empírica o movimento de moradia do centro de São Paulo, o presente artigo tem como objetivo principal analisar o significado das ocupações de imóveis ociosos promovidas por atores desse movimento na área central da cidade. Demonstramos, com isso, o papel dos movimentos sociais como atores que se colocam na posição de desafiantes das ideias, dos discursos e valores hegemônicos na sociedade. Por meio da fala dos próprios ativistas engajados nessa mobilização, discute-se também como o direito de morar no centro tornou-se uma pauta política gradualmente construída pelos setores populares. A metodologia adotada, de caráter predominantemente qualitativo, consistiu em revisão teórica, coleta de dados em documentos e material jornalístico e entrevistas com militantes. Como conclusão, sugerimos que o principal significado das ocupações nas áreas centrais consiste no questionamento do modelo hegemôni-co de urbanização na sociedade brasileira, que, historicamente, afastou as camadas mais pobres em direção aos cinturões periféricos das cidades.
INTRODUÇÃOA cidade de São Paulo é a mais rica do Brasil e, ao mesmo tempo, uma das mais desiguais do mundo. Para uma boa parte de sua população, morar em São Paulo significa percorrer grandes distâncias no deslocamento entre casa, trabalho e casa, conviver com uma infraestrutura urbana muitas vezes precária e (ou) insuficiente e enfrentar o alto valor do solo urbano -o que impacta diretamente no valor dos imóveis e no custo do aluguel da moradia. Tais dificuldades resultam, especialmente, de um modelo de crescimento urbano pautado pelos interesses do mercado especulativo de terras, setor articulado em maior ou menor medida com outros atores econômicos.Esse modelo urbano -que, evidentemente, não é exclusivo de São Paulo -foi responsável pela produção de uma cidade segregada, onde o centro e suas adjacências foram predominantemente habitados pelos ricos e pela classe média, enquanto as classes mais pobres viram-se forçadas a residir nas localidades mais periféricas, o que significava um afastamento das melhores localizações da cidade.