Este trabalho busca investigar a gramática da ação de trabalhadores em cooperativas de produção constituídas no bojo dos processos de reestruturação econômica ocorridos no Brasil a partir dos anos 90 do século XX. Com base em uma sociologia da experiência, decompomos a lógica da ação dos trabalhadores engajados na formação de duas cooperativas de produção, onde procuramos investigar: a) as relações de solidariedade, b) a lógica da ação estratégica em cada coletivo de trabalhadores, e c) os processos de subjetivação expressos na construção identitária dos trabalhadores das cooperativas investigadas. Investigando duas cooperativas de produção na região metropolitana de Porto Alegre, verificou-se um processo de subjetivação marcado por uma atitude ambivalente entre o compromisso com o projeto de construção da cooperativa e uma postura pautada por certo pragmatismo tipificado por um campo de possíveis, restrito no tocante às alternativas de reinserção social. PALAVRAS-CHAVE: gramática da ação, solidariedade, cooperativas de produção, autogestão, sociologia da experiência.
INTRODUÇÃOA chamada crise da sociedade salarial, 1 que se evidencia de forma nítida na reestruturação econômica e nos processos de reorganização e flexibilização das condições de uso da força de trabalho que acometeram a economia mundial, mormente na última década do século XX, 2 tem engendrado estratégias defensivas por parte dos sindicatos e da classe trabalhadora no sentido da preservação de suas condições materiais de subsistência. Tais estratégias têm se configurado na constituição de cooperativas como alternativa para assegurar o trabalho e a geração de renda para o contingente de trabalhadores engolfados pelos processos de reorganização das bases de acumulação capitalista.Por seu turno, a formação de cooperativas de trabalhadores também concorre para produzir controvérsias teóricas 3 sobre as possibilidades concretas de as cooperativas se constituírem num avanço efetivo em termos da democratização do trabalho e autonomia dos trabalhadores a partir da eliminação das antigas hierarquias que caracterizavam a gestão das empresas em questão e da criação de novas solidariedades operárias. Assim, o trabalho autogestionário também é percebido como uma contrafação democrática, como mais um item da panóplia patronal para flexibilizar e reduzir os custos da mão de obra. 4 Não obstante, tal discussão acaba sendo pouco frutífera do ponto de vista da compreensão das relações sociais tramadas nessas formas de organização social do trabalho. In-