Resumo Neste artigo, Renato Ortiz recorda sua primeiras leituras da obra do autor na década de 1970 quando estudava na França. Observa que no Brasil a recepção de Bourdieu não se fez sem controvérsias, entre outros motivos, devido aos debates sobre sociologia da ordem e sociologia do conflito, nos quais se identificava a sociologia de Bourdieu à primeira. Conta de sua relação com Florestan Fernandes para a organização e publicação da coletânea sobre Bourdieu na Coleção Grandes Cientistas Sociais pela Ática. Depois dos anos de 1980, entretanto, a obra do sociólogo francês é cada vez mais difundida nas ciências sociais brasileiras, contribuindo para isso, tanto a modernização e autonomização das instituições científicas brasileiras quanto a apropriação pelas ciências sociais de nova concepção de poder, nos anos de regime democrático, a qual permitiu a distinção entre política e poder.
A globalização declina-se preferencialmente em inglês. Digo, preferencialmente, pois a presença de outros idiomas é constitutiva de nossa contemporaneidade, mesmo assim, uma única língua, entre tantas, detém uma posição privilegiada. Há razões objetivas para que as coisas tenham se passado dessa maneira, e elas nada têm a ver com os fundamentos fonéticos ou gramaticais, seria tolice pensar a existência dos idiomas de forma substancialista (embora muitos o tenham feito). Os lingüistas ensinam-nos que toda linguagem é capaz de exprimir em conceitos a experiência humana, assim nenhuma delas é superior às outras. Sabemos ainda que somente os humanos possuem uma linguagem coerentemente articulada num sistema complexo de signos e que a diversificação das línguas é algo que ocorreu muito cedo nas sociedades passadas. Independentemente das hipó-teses disponíveis, e não confirmadas, sobre a origem da linguagem -monogenese ou poligenese -, a verdade é que, uma vez em atividade, elas evoluíram em comunidades separadas, espalhando-se por diversas regiões do planeta (existem atualmente algo em torno de 6.500 línguas faladas no mundo). Levando-se em consideração essa diversidade e o fato da impossibilidade de existir uma língua universal -para isso seria necessário que todas as experiências humanas convergissem para uma única fonte de sentido -seria insensato balizar nossa discussão na premissa de um mundo unívoco. O processo de globalização não é sinô-nimo de homogeneização, tampouco de americanização, trata-se de uma condição na qual as hierarquias e as linhas de força certamente existem, são desiguais, mas não implicam necessariamente a eliminação das diversidades. Nesse sentido, o desaparecimento das línguas nacionais, idealizado
O artigo tem por objetivo problematizar o universal e a diversidade. Investiga as possíveis implicações da polissemia dos termos universalidade e diferença, dentro das perspectivas filosófica, sociológica e antropológica. Destaca que a diferença não possui um valor "em si", uma "estrutura" ou "essência" atemporal. A diversidade existe em situações históricas determinadas, ela deve também ser qualificada. Nesse sentido, não é tanto a oposição em relação ao universal que interessa, mas a forma como a mudança de contextos incide sobre nossa compreensão desses conceitos. Discute ainda a questão do local e do nacional, que não são considerados dimensões em via de desaparecimento dentro da "sociedade global". Busca, então, entender como esses níveis são redefinidos, visto que na globalização co-existe um conjunto diferenciado de unidades sociais: nações, regiões, tradições, civilizações e a diversidade é parte integrante dessa totalidade. Conclui que universal e particular são pares opostos. A diferença associa-se ao particular, à contenção, aos limites e à identidade, sendo assim incompatível com o movimento de universalização. O universal remete à idéia de expansão, quebra de fronteiras, "todos", humanidade. Entretanto, na situação de globalização, muitas vezes esse par antagônico se entrelaça, mesclando alguns valores antes fixados a apenas um de seus elementos.
Resumo: "Retratos do Brasil", "interpretação do Brasil", "pensamento brasileiro", "teoria do Brasil", todos esses termos remetem a uma unidade fundamental: um determinado país. Existe uma longa tradição que se dedica à sua compreensão, à sua decodificação; de fato, há inclusive um plêiade de autores que fazem parte deste panteão (Rocha Pita, Varnhagen, Sílvio Romero, Nina Rodrigues, Euclydes da Cunha, Sérgio Buarque de Holanda, Gilberto Freyre, Cai Prado Jr., Darcy Ribeiro, apenas para citar alguns deles). Todo debate sobre identidade nacional pressupõe algumas categorias de análise, sendo nação e cultura duas dentre as mais importantes. O presente artigo pretende abordar qual o sentido deste debate no mundo contemporâneo. Em que medida as transformações ocorridas nas últimas décadas incidem sobre a imagem que temos de nós mesmos, isto é, as representações simbólicas construídas em torno da tradição brasiliana são impactadas por tais eventos? Qual o seu legado intelectual? Palavras-chave: brasilidade; cultura brasileira; identidade nacional; globalização. "R etratos do Brasil", "interpretação do Brasil", "pensamento brasileiro", "teoria do Brasil", os termos remetem a uma unidade fundamental: um determinado país. Existe uma longa tradição que se dedica à sua compreensão, à sua decodificação, há mesmo um plêiade de autores que fazem parte deste panteão: Rocha Pita, Varnhagen, Sílvio Romero, Nina Rodrigues, Euclydes da Cunha, Sérgio Buarque de Holanda, Gilberto Freyre, Caio Prado Jr., Darcy Ribeiro. A lista é imensa, novos nomes podem ser acrescentados uns ao lado dos outros, no entanto, a premissa que orienta este esforço classificatório de consagração é a mesma: pertencem ao conjunto os que se dedicaram ao entendimento de "nossa" realidade.1 Por isso a expressão "brasiliana", nos anos 1930, a designar uma coleção específica de livros da Editora Nacional, adquiriu com o passar do tempo uma abrangência maior e, sob a sua égide, reúne-se um acervo de conhecimento e saber sobre a vida brasileira (existe atualmente uma Brasiliana eletrônica). Uma espécie de biblioteca onde se conserva a herança nacional. O pensamento brasileiro encontra assim um suporte material para se realizar. Esta tradição, constituída de autores com pontos de vista distintos e conflitantes, antecede qualquer debate sobre cultura e identidade nacional, ela baliza nossa compreensão sobre as questões relevantes a serem discutidas: modernidade inacabada, mestiçagem, imitação do estrangeiro, atraso etc. Pode-se dizer que no Brasil e na América Latina existe uma obsessão pelo nacional, isso faz com que a problemá-tica da identidade seja recorrente, ou como diz Ruben Oliven, um "eterno retorno".
2A pergunta "quem somos nós" recebe respostas diferentes em função da inclinação teórica dos autores, do contexto histórico, dos interesses políticos, mas permanece ao longo do tempo como inquietação insaciável. Mas qual seria o sentido deste debate * Departamento de Sociologia/Unicamp.
Num mundo globalizado a diversidade cultural deve ser pensada de um ponto de vista cosmopolita. Somente uma visão universalista pode valorizar realmente o que denominamos "diferença".
gação que subjaz este ensaio tem alguma razão de ser, sempre tive um fascínio por seus escritos. No final dos anos de 1970 estudei sistematicamente os Quaderni del carcere, o que me estimulou a escrever alguns estudos publicados em meu livro A consciência fragmentada. Entretanto, chamava-me menos a atenção a perspectiva propriamente política (partido, revolução ou reforma, Estado, força e consenso), do que o esforço argumentativo do autor que expressava uma poderosa mente analítica capaz de formular e apreender uma série de problemas sociológicos. Isso me conduziu a comparar sua abordagem sobre a problemática da religião à de Max Weber. Retomo, assim, uma intuição antiga, procurando agora, num momento distinto de minha vida e da história das sociedades, dar-lhe forma e consistência. Ao se defrontar com a obra gramsciana, o leitor dificilmente escapará de uma sensação insistente: trata-se de um pensamento datado. Vários elementos confirmam essa dimensão. Primeiro, é
O texto retoma os diferentes estágios de cognição a respeito da problemática da globalização nas ciências sociais, desde a década de 1980. Destacam-se as feições tomadas pelo debate tanto na maneira implícita como ele se apresenta na disputa entre modernidade e pós-modernidade, envolvendo autores como Lyotard e Habermas, quanto na emergência de um "senso comum planetário", em que se naturalizam os processos e estruturas que definem um destino e horizonte comum para a humanidade, mas à luz das diferenças e desigualdades que conformam as especificidades dos espaços e das posições sociais no mundo contemporâneo. Deste modo, são discutidas as potencialidades analíticas de categorias como modernidade-mundo, situação, entre outras, para fazer frente ao desafio das disciplinas socioantropológicas na explicação e interpretação de realidades em que o global, o nacional e o local se interpenetram mutuamente.
A primeira vez que tomei consciência de que seria um praticante dos Estudos Culturais foi em Berlim, numa conferência organizada por Hermann Herlinghaus, em 1995. No ano seguinte, num seminário realizado em Stirling (Escócia), do qual Stuart Hall era um dos participantes, essa sensação se reforçou, pois, ao lado de meus amigos Nestor Garcia Canclini e Jesus Martin Barbero, lá me encontrava como representante de algo que nunca me tinha ocorrido. O questionário proposto pela Universidade de Stanford cita-me como um dos mais "sobresalientes" latino-americanistas dedicados aos Estudos Culturais, o que me dá grande satisfação. Entretanto, apesar dessa evidência, a imagem que tenho entre meus colegas brasileiros não se ajusta a ela. Para eles sou simplesmente sociólogo ou antropólogo, embora meus escritos, lidos e apreciados em áreas distintas, como crítica literária, arquitetura, geografia, comunicação, se encaixem mal nas fronteiras disciplinares existentes. Pessoalmente não tenho nenhuma angústia identitária, mesmo em tempos de globalização, quando muitos estão assombrados pelo afã insensato de decifrar o seu "eu" maior. Sinceramente creio que não deveríamos ter nenhuma carteira de identidade, ela diz pouco sobre nossa individualidade, mas uma "carteira de diferenças", rica, complexa, indefinida, reveladora da diversidade de nossos itinerários ao longo da vida, fechando-se somente com a nossa própria morte. Mas, se as representações sobre meu trabalho são distintas "fora" e "dentro" do Brasil,
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