Este artigo analisa a obra clássica de M. Mauss, Ensaio sobre a dádiva, à luz de desenvolvimentos recentes da Antropologia. Salienta como contribuição de Mauss o entendimento da dimensão política da troca de dádivas, assim como a sugestão de sua universalidade, posteriormente demonstrada por Lévi-Strauss, constituir-se em princípio formal-abstrato, e não num fato empírico-concreto. A partir desse princípio, avalia a tese segundo a qual a dádiva é fundamento de toda sociabilidade e comunicação humanas, assim como sua presença e sua diferente institucionalização em várias sociedades analisadas por Mauss, capitalistas e não-capitalistas.
Este artigo avalia criticamente a contribuição de Pierre Clastres para o entendimento do poder, enfatizando sua noção de "sociedade contra o Estado". Mostra que a crítica de Clastres a Lévi-Strauss não exclui uma proposta particular de atualização daquilo que o primeiro denomina "troca recíproca" e indica que sua reflexão depende de uma concepção da reciprocidade que a confunde simultaneamente com simetria, equivalência e igualdade. Mostra ainda que a noção de "sociedade contra o Estado" não deixa de se fundamentar, em última análise, na proposição de um modo específico de relação de troca entre os termos "sociedade" e "Estado". Esta troca, cuja existência é negada por Clastres, é implícita e inconscientemente afirmada por ele.
This article critically evaluates P. Clastres's contribution to our understanding of power, with particular emphasis on his notion of "society against the State". It demonstrates that Clastres's critique of Lévi-Strauss does not exclude a particular understanding of what he calls 'reciprocal exchange' and also indicates the extent to which the author's reflections are based on an understanding of the notion of reciprocity which mistakes it simultaneously for symmetry, equivalence and equality. The article likewise shows that the notion of "society against the State" depends on a specific kind of exchange relationship between 'society' and 'the State'. The existence of this exchange - explicitly denied by Clastres - is at once implicitly and unconsciously presumed by him
RESUMO: Este artigo aborda o contraste entre uma modalidade de troca explicitamente qualificada por Mauss, na década de 1930, como "comunista" e as modalidades "agonística" e "mercantil". Mauss nunca foi comunista, mas sim um socialista engajado. Como tal, lançou à Revolução Russa seu olhar de etnógrafo, sem deixar de considerar sua importância como "experimento". Vê como inspiração do Ensaio sobre o dom o impacto que lhe causaram tanto uma visita à Rússia comunista no início da década de 1920 como a Nova Política Econômica de Lênin, que reconhecia a impossibilidade de abolição do mercado. Questão implícita do Ensaio é a possibilidade de uma nova sociedade, na qual o Estado englobaria o mercado, ambos entendidos como transformações lógicas e históricas de formas particulares da dádiva, o tributo no caso do Estado. PALAVRAS-CHAVE: Marcel Mauss, Comunismo, Estado. Para Terence S. Turner, nosso professor.No século XIX, vários autores, como Saint-Simon e Herbert Spencer, propunham que a coerção estatal não seria eterna, tomando a história humana como a transformação das sociedades em direção à competição econômica e aos contratos livremente assumidos entre indivíduos. A so-
Este ensaio demonstra a posição central que o artigo "Cosmologias do Capitalismo" ocupa na obra de Marshall Sahlins. Simultaneamente, levanta críticas a algumas proposições de Sahlins, assumindo uma perspectiva interna à sua obra. Esta perspectiva privilegia o fato de que o "setor transpacífico do sistema mundial" é de fato composto por um sistema de trocas, mas que estas trocas fazem muito mais do que apenas interligar funcionalmente diferentes sociedades. O presente texto radicaliza este argumento, tentando mostrar que uma antropologia das trocas pode fundamentar um estudo da história de quaisquer sociedades indígenas e de seus contatos com realidades capitalistas.
This paper reveals the central position that the article "Cosmologies of Capitalism" occupies in the work of Marshall Sahlins. At the same time, it suggests criticisms of some of Sahlin’s propositions, but does so by assuming a posture internal to the author’s work. This perspective stresses the fact the "trans-Pacific sector of the world system" is, indeed, composed of a system of exchanges, but that these exchanges serve to do much more than to inter-connect functionally different societies. The present paper radicalises this argument and tries to show how an anthropology of exchange can be the basis for the study of the history of any Indigenous society and of its contacts with capitalist realities
Resumo Este estudo explicita e critica a conjunção entre análises simbólicas e funcionais do compadrio. Mostra-se que o compadrio não é apenas uma instituição religiosa ou Abstract This study criticizes a conjunction between symbolic and functional analysis of godparenthood. It is shown that god-parenthood is not only a religious or kinship institution and that it does not reinforce inequalities that supposedly pre-exist it, but rather it is a structure that generates inequalities. God-parenthood is understood as a structure by the description of reciprocity circuits. Understood as the circulation of a child from
RESUMO: O artigo apresenta leitura de O Pensamento Selvagem, de C. Lévi-Strauss, buscando demonstrar sua importância para a antropologia atual. Salientamos sua apresentação do "pensamento em estado selvagem" como possibilidade ou mesmo necessidade formal de todo pensamento humano, sua manifestação como arte, mito, bricolagem e sua relação com a ciência. Como se sabe, entre outras contribuições, esse livro apresenta uma noção de transformação entre conjuntos analíticos sistemáticos. Ao mesmo tempo, demonstra ser a atividade classi catória inelutável, a rmando um homem condenado a classi car, seja de modo totêmico, seja sacri cial. Nesse quadro, procuramos reunir diferentes estilos de pensamento -inclusive os nossos próprios, eles também bricolagens e classi cações. Discutimos o contraste entre sistemas classi catórios totêmico e sacri cial, para depois confrontarmos antropologia e história e nalmente debatermos a questão do lugar da antropologia em um triângulo arte-ciência-mito. PALAVRAS-CHAVE: C. Lévi-Strauss, O Pensamento Selvagem, sacrifício, história, arte.Este artigo é fruto de discussões em torno de O Pensamento Selvagem, de Claude Lévi-Strauss, realizadas no Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal de São Carlos 1 . Ele apresenta alguns temas básicos desse clássico, que a nosso ver merecem explicitação,--já aponta para algo além das moralidades -do "ser bom", do "proceder honesto", da di culdade -, a saber: o "rabo da palavra". Exemplo do que poderia ser considerada uma metáfora totêmica, esta expressão apresenta descontinuidades entre as séries da Natureza e da Cultura. Está implícita a diferença, dada num eixo paradigmático, entre "rabo" e, por exemplo, "cabeça"; assim como implícito está ser a "palavra" um termo de uma série social. Aprofundar este tipo de homologia e diferença seria tarefa para um estudo ao modo estruturalista da obra de Guimarães Rosa, que, passível de ser feito, não cabe aqui. Mas a expressão "o rabo da palavra" já contém um sistema diferencial, cujos termos -os signos -transitam em permutações, oposições e inversões metaforicamente transformadas no plano do signi cado. A Natureza -no caso, o rabo -é gurada por uma destotalização da noção de espécie. Essa, por sua vez, como mostra Lévi-Strauss, é operadora de variados sistemas em processos lógicos de totalizações e destotalizações: "a noção de espécie possui assim uma dinâmica interna: coleção suspensa entre dois sistemas, a espécie é o operador que permite passar (e mesmo, obriga) da unidade de uma multiplicidade à diversidade de uma unidade" (Lévi-Strauss, 1962: 180) 2 . O rabo é o fundo, o "por detrás", e esboça a dimensão ou série "Natureza". Já a "palavra", que tem o rabo, está, por sua vez, na série da "Cultura" e, nesses termos, pode signi car toda a cultura. Ir até o fundo (da cultura), mas sem se desprender da série natural com a qual está relacionada: aquilo que sintetiza o perigo e a di culdade do viver, para Guimarães Rosa, já exprime um sistema e, mais que isso, a signi cação, na perspecti...
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